Carro de passageiros para atendimento único às mulheres simplesmente não colou
São 17h e, em determinado ponto da
plataforma de embarque e desembarque do metrô em Santa Efigênia, na Região
Leste de Belo Horizonte, um grupo de mulheres se posiciona para aguardar a
parada do trem. Parecem ansiosas para experimentar a novidade: um vagão só para
elas. E se mostram frustradas quando o aproximar lento da composição revela
que, naquele espaço presumidamente exclusivo há uma quantidade sem-fim de
homens. O Estado de Minas pegou o metrô no horário de pico das tardes de quinta
e sexta-feira e constatou que o carro de passageiros para atendimento único às
mulheres simplesmente não colou. Tudo parece como antes de a lei prevendo a
diferenciação entrar em vigor: sem qualquer separação de gênero. Com opiniões a
favor e contra, inclusive do público a ser beneficiado, certo mesmo é que o
assunto se tornou uma queda de braço entre o Legislativo municipal e a
Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), tendo ido parar nos tribunais em
Brasília. Esta semana promete ser ainda mais apimentada e envolver outros
atores: o Ministério Público será acionado para obrigar a Prefeitura de Belo
Horizonte (PBH) a tomar partido na história.
Por determinação da Lei municipal
10.989/16, das 6h30 às 8h30 e das 17h às 19h, o segundo carro da composição
deve ser ocupado exclusivamente pelas mulheres. A medida começou a vigorar na
segunda-feira passada e garante, a princípio, que o público feminino não seja
assediado nos trens. O “vagão rosa”, como é popularmente conhecido, não tem
qualquer diferenciação em BH. Não há cartaz informando sobre a exclusividade
nem agentes da ferrovia orientando passageiros. Apenas um aviso sonoro,
disparado pouco antes da chegada do trem, lembra a determinação da lei
municipal.
Regulamentação
O autor dela, vereador Léo Burguês
(PSL), diz que vai acionar, esta semana, o Ministério Público para cobrar da
PBH a regulamentação da lei, cujo prazo, segundo ele, venceu na segunda
passada. Para o vereador, a falta dela influencia na desobediência às novas
regras. “O prazo de regulamentação é de 30 dias depois da publicação (em 20 de
outubro). A prefeitura não o fez. Por isso, estamos impossibilitados de fazer
denúncias aos fiscais para que autuem a CBTU, que tem uma grande má vontade com
essa lei”, afirma, lembrando que ela nasceu de um abaixo-assinado com 12,5 mil
nomes entre homens e mulheres sobre a questão.
A lei foi assinada pelo presidente da
Câmara, Wellington Magalhães (PTN), não tendo sido sancionada pelo prefeito
Marcio Lacerda. Ela não prevê punições para os infratores, o que, de acordo com
Léo Burguês, ele esperava ser tratado na regulamentação. O vereador afirma,
ainda, que, mesmo sendo órgão federal, a PBH pode arbitrar, sob alegação de que
a CBTU faz um transporte municipal. A prefeitura discorda e anunciou, por meio
da assessoria, que, além de considerar a lei inconstitucional e, por isso, não
poder regulamentá-la, não tem poder de fiscalizar órgão federal.
Inconstitucional é também o entendimento
da Associação Nacional dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos
(ANPTrilhos), entidade que defende os interesses das operadoras
metroferroviárias de passageiros em todo o país. Ela protocolou este mês
arguição de descumprimento de preceito fundamental, a ADPF 430, na qual
contesta a constitucionalidade da lei de BH. Na visão dos operadores
metroferroviários, essa medida não protege as mulheres e vai na contramão do
que elas precisam, que é respeito e dignidade. “Segregar as mulheres que usam
diariamente os trens e metrôs brasileiros, dando a elas uma ilusória sensação
de 'proteção' contra os assediadores, promove uma limitação injusta, fazendo
aceitar o entendimento de que aquelas que não usam o vagão exclusivo podem
estar sujeitas à agressão”, afirma a superintendente da associação, Roberta
Marchesi. Para ela, a medida fragiliza ainda a liberdade das mulheres nas ruas,
nos outros meios de transporte, nos elevadores e em suas próprias comunidades,
“porque não promove a civilidade e, a longo prazo, fomenta uma cultura de que a
mulher, para se proteger, precisa ser segregada”.
EMBATE
Além de BH, Rio de Janeiro e Brasília
têm leis que definem o uso de carros de passageiros para mulheres. Em São
Paulo, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) vetou o projeto. A ANPTrilhos afirma
que os dados existentes apontam a ineficiência da medida para tratar o
problema. “No Rio de Janeiro, pesquisas de caráter qualitativo no metrô
evidenciaram que a instituição de carro feminino serviu para acirrar o embate
entre homens e mulheres. A aprovação da medida não se apoia em uma necessidade
concreta, pois não fica muito claro para as usuárias se o abuso é uma atitude
deliberada ou se deve a um contato muito próximo entre as pessoas dentro dos
trens”, diz Roberta. A associação cita, ainda, pesquisa do metrô de São Paulo,
de 2014, segundo a qual 57% das passageiras rejeitaram a adoção do carro
exclusivo para coibir o abuso sexual. Elas consideraram, entre outros motivos,
que as pessoas precisam aprender a conviver, que a separação não é solução, o
carro exclusivo é uma forma de discriminação e uma regressão ao tempo em que as
mulheres não podiam sair de casa.
Outro problema, de acordo com a
entidade, é que, tecnicamente, a medida dificulta a operacionalização do
sistema, já que o público feminino é predominante nos sistemas metroviários.
Mais de 9,8 milhões de pessoas circulam diariamente nos trens e metrôs do
Brasil, sendo mais de 50% mulheres. “Como garantir o embarque de mais de 5
milhões de mulheres em um número limitado de vagões? Como fazer com que esses 5
milhões se acumulem nas estações aguardando uma vaga? Como garantir a fluidez
do transporte?”, questiona Roberta Marchesi. Ela acrescenta que os agentes de
segurança das estações estão prontos para atuar e receber a queixa de pessoas
que se sintam lesadas.
PONTO
CRÍTICO
Lei acirra a desigualdade de gênero?
Léo Burguês - vereador (PSL) e autor da Lei 10.989.
Essa lei funciona muito bem no Rio de
Janeiro, há 10 anos. As mulheres são amplamente favoráveis. Traz comodidade
para essa trabalhadora, que já tem uma vida difícil, enfrenta um transporte
público que não tem tanta qualidade e ainda passa por assédios de pessoas
mal-educadas e desequilibradas no metrô. A CBTU devia ter consciência e
procurar melhorar a qualidade do serviço empregado, pintando o vagão de uma
outra cor, por exemplo, e não discutir uma lei que está visando melhorar o
serviço.
Roberta Marchesi
Superintendente da Associação Nacional
dos Transportadores de Passageiros sobre Trilhos (ANPTrilhos).
A discussão da segregação por gênero nos
transportes coletivos não é cabível à realidade atual, em que as mulheres estão
presentes de forma expressiva e irreversível no mercado de trabalho e com
atuação efetiva nos vários setores da sociedade. Essas leis de proteção
aprofundam a violência contra as mulheres e acirram as desigualdades de gênero,
tendo em vista que as suas causas não são tratadas e nem discutidas em todas as
suas dimensões. Ao reforçar a ideia de fragilidade das mulheres, denotando a
sua incapacidade de se defender, a segregação reforça uma série de estereótipos
tanto masculinos quanto femininos.
Fonte: Jornal Estado de Minas, 27/11/16.
Enviado por: Profº Marcelo Osório Costa.
O assédio sexual é algo que não deveria acontecer , mas infelizmente algumas pessoas não tem respeito e o fazem , é necessário nessas circunstâncias a separação de homens e mulheres em transportes públicos ,pois ninguém merece passar por esse tipo de situação.
ResponderExcluirDeve haver alguma forma de fiscalização e punição aos que fazem assédio sexual nos transportes públicos, essa situação é totalmente constrangedora e as pessoas ficam com medo de reagir pois não sabem com quem estão lidando.
ResponderExcluirÉ vergonhosa as ações dos meliantes que não respeitam o outro. Infelizmente uma forma de prevenir a violência é a segregação entre os sexos.
ResponderExcluirO assédio em metros e ônibus é um dos maiores medos que causa em uma mulher.
ResponderExcluirConsequentemente deveria haver leis que prendem esses homens.
Chega a dar vergonha do nossos país.